Expansão da Mente X
De onde pode vir à inspiração para se escrever sobre o cenário das grandes cidades? Ruas esburacadas, no ar um cheiro forte de gasolina e óleo diesel, um bando de pessoas que vem e vão de todos os lugares e direções diferentes, prédios enormes que refletem a vida e os passos de cada uma delas.
Mas, do lado contrário o que prevalece é o terror. A violência está vencendo o amor. Por todos os lados, olhos enxergam a morte de um ser e alheio a cada um desses acontecimentos tem sempre uma mãe a chorar, um pai em prantos a sofrer.
E essa tal violência é algo tão fascinante do ponto de vista social, enquanto a vida das pessoas são tão normais. Andando nas ruas é sempre possível ouvir, alguém que lhe chama, berrando o seu nome, caminhando entre as vias, apartamentos acesos, tudo parece ser tão real, porém, todos assistiram a esse filme também. E todo esse caos que a violência e o banditismo proporcionam é literalizado em produções freqüentemente descritas com simplicidade, em tom bem cotidiano e completamente isento da pateticidade. A morte nessas circunstâncias tornou-se algo comum e aceitável.
Toda essa ausência de valores, o nada, o vazio para a vida caracteriza o homem pós-moderno. Um ser que abandonou os ideais do passado para valorizar a arte, já sabendo que não existe um céu e menos ainda um sentido concreto para a história. E dessa forma o processo é muito simples, entregar-se ao presente encantador do prazer e ao maravilhoso mundo do consumo individualista.
Com origem na arquitetura e computação nos anos 50, o Pós-modernismo se forma com a Arte Pop já nos anos 60. Daí seu crescimento é gradativo, até ganhar forças se alastrando pela moda, cinema, literatura, música e no cotidiano programado pela tecnologia.
O Cobrador
Imagine um homem, com idade girando em torno dos 25 anos. Não se tratava de uma pessoa qualquer, mas sim de um homem com uma ilustre posição na sociedade, um ótimo partido para casamento, diriam as famílias da elite e isso por gozar de popularidade e um alto-poder aquisitivo. Concretize agora que esse badalado burocrata, refém de um sentimento incomum de preocupação com o futuro da sociedade, resolve adotar uma identidade secreta, e com armas, capa e máscara incorpora um paladino da justiça fora da lei para lutar pelo bem mais precioso de seu povo, a liberdade. Sua luta é constante e logo virão dias melhores, a certeza disso vem com auxílio de... Pára tudo! Todos já devem ter visto uma história nesses moldes em algum lugar.
Mas o que dizer sobre um homem que cansado de pagar por tudo que precisa – roupas, comida, médico, moradia, diversão – decidindo que não pagará mais nada e só irá cobrar da sociedade tudo que ela lhe deve. Dessa forma começa todo o seu reinado de terror porque o preço que o cobrador exige custará muita violência e radicalismo.
É comum que o leitor mantenha a impressão de que o escritor está apresentando um gênero de trama a qual já está muito habituado e que durante o tempo adquirirá um domínio invejável. O Cobrador, este é o revolucionário conto de Rubem Fonseca, que dá o título ao livro publicado pela primeira vez em 1979. Mesmo tendo sido lançado há mais de 25 anos, o conto mantém sua originalidade, servindo ainda para retratar com inteligência e perspicácia o mundo atual desde os laços de amor até o horror das guerras. O pequeno texto é suficiente para provar que não é por mero acaso que o autor é considerado o mestre das narrativas curtas. Resumindo, o conto é bárbaro, apresentando uma tragédia que se mistura a imaginação do leitor, ainda com traços cômicos, diversão com o trabalho e histórias intensas com um romance às voltas.
O Mundo do Cobrador
O conto não possui uma transposição mecânica, o elemento literário transposto adquire várias e diferentes conceituações e matrizes. O Cobrador evidentemente foi construído nessa base, o próprio autor dá aos seus leitores essa indicação, com um personagem tão imbuído de ódio aos burgueses e aos bem situados na vida. Esse personagem não se caracteriza bem como um revolucionário sem causa fazendo justiça com as próprias mãos. E sim um revoltado que atua exclusivamente no plano individual.
Seus poemas “capengas” que beiram sempre a subjetividade estão a mostra, “come caviar/teu dia vai chegar”. Sua vingança não vai além do assassino frio e calculista, que antes de executar uma presa, insisti em parafrasear todo seu individualismo. “Tão me devendo colégio, namorada, aparelho de som, respeito, sanduíche, sorvete, bola de futebol”, além de algumas outras palavras durante os momentos de ação, “eu não pago mais nada, cansei de pagar! Agora eu só cobro!”.
Com tantos períodos de profunda exaltação, o leitor se vê perplexo ao descobrir o outro lado de um personagem tão cruel. Após vestir a máscara de o cobrador, o rapaz “cava” seu caminho de volta, dando lugar a uma figura sofrida e sensível. Tudo é ostentado pela sua relação com a velha dona Clotilde, de quem aluga um quarto e atesta com ênfase todo o carinho e ternura de que é capaz. Mas ao assumir a figura de “O Cobrador”, suas ações percorrem rumores inacreditáveis beirando o hiperbolismo e evidentemente utilizando um novo timbre, ecoa sua voz e diz: “Onde eu passo o asfalto derrete”.
O amor está no ar em uma figura de moça da burguesia, deixando o leitor ainda mais estarrecido. A moça também revela uma revolta promíscua, fazendo com que as ações violentas do conto, no final, transformem-se em algo de maior amplitude. Agora, partindo em companhia de Ana para realizar seu reinado de terror, o casal tem seu relacionamento alimentado pela vingança, sem usar em qualquer momento a imagem de revolucionário.
Discutindo a Trama
Enquanto a obra segue com sua narrativa, fica bem clara a mistura de imaginação e realidade – real que não desaparece e nem se dissolve no fluxo das palavras. Mas, existem formas de se apagar as diferenças entre o real e imaginário? Observando as relações dos personagens na trama, percebe-se que Rubem fabrica um hiper-real, espetacular, uma realidade com mais veracidade e ainda mais interessante que a própria realidade.
Seria o real ficcional ou prevalece à veracidade e não a imaginação. O autor retrata o real dando uma maior dimensão, atestado pelo real que se transformou em algo ficcional – a ficção ficcionalizada. O hiper-realismo fascina por ser o real intensificado na cor, no tamanho e em suas propriedades. Sendo quase um sonho no ambiente pós-moderno que significa basicamente a relação do homem com os meios de comunicação tecnológicos. Trazendo informações sobre o mundo e o refazendo a sua maneira, hiper-realizam transformando tudo – e todos – em um grande espetáculo.
Expressar a contraposição diversificada, unificada habilmente dentro de um mundo ficcional rico, está bem contido em um pequeno conto. Em literatura, citando particularmente a ficção, o pós-modernismo prolonga a liberdade de experimentação e invenção. Nessa literatura, não se deve crer piamente naquilo que está sendo dito. Não se tratando de um relato social a traçar um retrato da realidade, mas de um jogo com a própria literatura e sua história a ser retomada de maneira irônica e alegre.
O perfil do homem é traçado de modo diferenciado, podendo se resumir a uma gota de luz preso a uma estrela que cai dentro de uma fagulha tão só. Não sendo nada mais do que se queira ser, como um breve pulsar, um antigo silêncio com a idade do céu. Também não indo além de um punhado de mar, a maior piada de Deus, apenas um grão de sal na imensidão do céu.
A Vulgaridade
O Cobrador dá um tratamento hiper-realista ao sexo e a violência, que pode ser definido até como a exacerbação do vulgar. A sedução desse período instiga o individuo a liberar seus desejos mais íntimos e contraditórios. Como mostra esse trecho do conto de Rubem Fonseca.
“Tira a roupa. Não vou tirar a roupa, ela disse, a cabeça erguida. Estão me devendo xarope, meia, cinema, filé mignon e buceta, anda logo. Dei-lhe um murro na cabeça. Ela caiu na cama, uma marca vermelha na cara. Não tiro. Arranquei a camisola, a calcinha. Ela estava sem sutiã. Abri-lhe as pernas. Coloquei os meus joelhos sobre as suas coxas. Ela tinha uma pentelheira basta e negra. Ficou quieta, com olhos fechados. Entrar naquela floresta escura não foi fácil, a buceta era apertada e seca. Curvei-me, abri a vagina e cuspi lá dentro, grossas cusparadas. Mesmo assim não foi fácil, sentia o meu pau esfolando. Deu um gemido quando enfiei o cacete com toda força até o fim. Enquanto enfiava e tirava o pau eu lambia os peitos dela, a orelha, o pescoço, passava o dedo de leve no seu cu, alisava sua bunda. Meu pau começou a ficar lubrificado pelos sucos da sua vagina, agora morna e viscosa. Como já não tinha medo de mim, ou porque tinha medo de mim, gozou primeiro do que eu. Com o resto da porra que saía do meu pau fiz um círculo em volta do umbigo dela.”
Tanto nos dias atuais como há duzentos anos, esse trecho da obra chocaria e criaria uma enorme polêmica. Mas também é excitante e isso é impossível negar, mesmo que a narrativa se trate propriamente de um estupro. E quanto à excitação, não há porque se julgar mal, e para atestar isso basta acompanhar a reação da personagem nessa passagem. Depois de tentar reagir contra a intenção do Cobrador e não conseguir conter seu ímpeto – a jovem cede aos seus prazeres e acaba ejaculando, tendo tenramente esquecido que estava sendo violentada, por alguns instantes era como se embarcasse em uma relação casual.
A maior aceitação para esse tipo de produção – assim como para os escritores que adotam esse gênero – pode ser atribuída a algumas características desse período pós-moderno. Atualmente o homem não é religioso, mas sim psicológico. Pensando mais na expansão de sua mente do que propriamente na salvação de sua alma. E isso tem seu valor relevante porque essa nova cultura psicológica é mais libertadora. E o sujeito dessa nova época se interessa pela imposição de seu ego sem fronteiras, sem a presença de uma consciência vigilante.
O pós-modernismo mesmo não se preocupando em fazer o “novo” é uma droga boa e saudável. Abalando preconceitos e pondo fim ao muro que separava a arte culta e de massa. Rompendo as barreiras entre os gêneros, existe hoje uma democratização das produções. Porque o sujeito pós-moderno é a glorificação do ego no instante, sem esperança alguma no futuro. Pois a vida já não é exatamente um problema a ser resolvido, mas experiências em série para se fazer, aberto ao mundo do infinito.
7 Coveiros:
Tema interessante!
Espero q seu blog faça sucesso!
Post enorme...Mas valeu sim a pena ir até o fim
belo texto
abração
post embora longo é interessante
Muito culto, longo e super bem escrito
veio vc é inteligente d+
Muito bom o blog
www.benhowmonteiro.blogspot.com
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