26 de junho de 2009

Maldito padrinho – A mágica do tempo

Essa realmente aconteceu, é totalmente verdade... Então “SeNTia qUe La VeM a EsToRRRia”

O carnaval passava bastante desanimado naquela região. A música me deixava entediado. Como suportar a presença maçante dessa indústria bundural? O ódio abre espaço para a dúvida: “O que estaria fazendo em meio a uma festa onde o som que agita é por mim tão desprezado?” Inacreditável, mas a resposta é muito simples, tinha esperanças de encontrar uma “amiga”, Sônia. Mas nesse segundo dia de carnaval, parecia impossível achar qualquer vestígio dela.

O tempo foi passando, decidi voltar para casa, quando no caminho encontrei alguns amigos a beber e dançar. Fui convidado para me juntar a eles, e como sabia ser impossível fugir das bundas ou digo, música, lastimei novamente não ter encontrado a minha “amiga”. Então decidi ficar e tentar me divertir um pouco, esquecer os problemas e imaginar no palco o Renato Russo tocando MÚSICA para as bundas ouvirem.

O decorrer da festa foi bastante divertido, meus amigos me faziam soltar tanta gargalhada que a festa não parecia tão ruim, e assim fui, aos poucos, me acostumando com tudo aquilo, entrando no clima. Os companheiros logo destacaram minha mudança, dizendo que agora estava mais sorridente. Fiquei bastante surpreso. Puderam perceber meu mau humor inicial.


A festa prosseguiu, estava cada vez mas solto (na verdade bêbado, mas dessa forma soa mais bonito, é mais light) quando percebi uma menina me olhar a alguns metros de distância. Logo um de meus colegas disse que ela já me observava há algum tempo, desviando ligeiramente o olhar e voltando pouco tempo depois, tudo com o intuito de não ser descoberta pelos demais do grupo. Estranho é que só eu não percebia!

Minha política de privacidade não durou muito tempo. A forma dela dançar, sacudindo seus longos cabelos encaracolados, me provocava bastante. Aquela dança disfarçadamente erótica vinha acompanhada por seu olhar medonho, uma feição de desejo e provocação. Não conseguia deixar de olhar, e logo a maioria de meus companheiros também se deixaram hipnotizar pela dança, que mais parecia um pré-acasalamento.


Acabada a dança, a desconhecida novamente lançou um olhar, caminhando em seguida a passos lentos, quase sumindo por entre a multidão. Antes que meus colegas pudessem me mandar segui-la, caminhei em disparada,seguindo o vácuo de seus passos.

A jovem caminhou por cerca de meio quilômetro, agora fora do alcance dos meus companheiros. Já sentada, notei que a cada passo estava mais próximo. Aquilo que parecia bom, logo se tornou um problema: “O que diria a ela?” A ansiedade foi tão forte que não lembrei de bolar uma estratégia, tipo um repertório dos assuntos que iria conversar, a primeira coisa que diria ao estar diante dela. Foi uma decisão arriscada: decidi agir por naturalidade, não havia tempo de pensar em nada, talvez sendo eu mesmo, obteria sucesso – quanta petulância – e aí não teria tempo de usar uma máscara, seria autêntico sem qualquer falso moralismo.

- Boa Noite? – Disse-lhe.

- Ótima, não quer se sentar?

A garota era direta. Nessa hora fiquei bastante acanhado. Antes de nos apresentarmos, ela me disse se chamar Michele. Dei dois beijos de leve em seu rosto e me apresentei sentando logo após:

- Rafael, para o que der e vier – odeio me lembrar disso.

Conversamos durante algum tempo, falei que antes estive bastante mal humorado, procurava uma “amiga” e não a encontrei, falei também que graças à cerveja – ainda estava bêbado - pude me animar um pouco. Depois tentei saber algumas coisas sobre ela, que garantiu ser um andarilho, uma pessoa em busca de algo que nem ela mesma sabia o quê! Sempre a vagar pelo mundo.

Pensei, a princípio, que tinha encontrado alguém igual a mim, uma falsa moralista por trás de uma máscara para esconder de si e dos outros sua personalidade medonha e abstrata. Estava curioso, o desejo já não parecia tão intenso, forte era a curiosidade em descobrir um pouco mais sobre a misteriosa garota.

Tantas tentativas, tudo em vão. Michele sempre arrumava um jeito de driblar minhas perguntas e, claro, deixando-me com muitas dúvidas. Então ela lançou a grande cartada:

- Logo irá amanhecer. Adoraria ver o sol nascer na praia. Gostaria de me acompanhar?

Esqueci a curiosidade, a proposta era irrecusável, ninguém pode prever o que acontecerá durante um inofensivo nascer do sol, principalmente em tão agradável companhia. Quando ia balançar a cabeça a fim de aceitar o convite, novos dilemas surgiram: Com que finalidade queria me levar à praia? Respostas surgiram imediatamente: Talvez ela morasse no fundo do mar, uma versão feminina do “Boto” querendo me possuir e me deixar apaixonado. O medo tomou conta! Ou seria ela uma sereia a fim de me hipnotizar e levar meu corpo para o fundo do oceano? Já me via boiando pela manhã nas águas quentes do rio Tietê. Também enxergava meu velório, meia dúzia de pessoas chorando enquanto outras trinta fingiam sofrer e se remoíam por dentro de tamanha alegria por saberem que só voltariam a me ver no inferno.

Fiquei calado sem responder ao convite. Ela repetiu, talvez imaginando que eu não houvesse escutado.

-Logo irá amanhecer. Adoraria ver o sol nascer na praia. Gostaria de me acompanhar?

Chegou o momento de tomar uma decisão, antes dela perceber o contexto. Analisei os prós e contras, então decidi aceitar. Não me perdoaria em carregar essa dúvida para o resto da vida, sempre me fazendo a mesma pergunta: “O que teria acontecido naquela noite?” Assim fomos caminhando juntos em direção da vida ou...

Caminhávamos pela praia, esperando o bendito sol nascer. Nem era em Michele que pensava, mas sim em Sônia, minha amada “amiga”. Não havia dúvida, era com ela que realmente queria estar caminhando naquele momento, ver o sol raiar ao seu lado, um sonho perdido. Nem Deus pode garantir que iria sobreviver às garras da misteriosa Michele.

O pensamento em minha “amiga” foi tão profundo que não notei: Michele não estava ao meu lado. Hesitei um pouco em olhar para trás, quando uma voz chamou por meu nome, o som me era familiar, não poderia haver engano: era Sônia!

Corri ao seu encontro, abracei-a forte por um longo tempo, e até me esqueci de Michele. Apenas estava feliz, pois não é sempre que os sonhos se realizam. Quando notei que Sônia não se empolgava com minha demonstração de carinho, voltei ao planeta Terra e, à primeira vista, concluí: Isso tudo não tem nexo!

-Cadê a Michele? - Perguntei esperando que ela tivesse a resposta.

-Eu sou a Michele! - Exclama Sônia bastante insatisfeita.

Por pouco não desmaiei. Nenhum psicólogo, por mais renomado que fosse, poderia explicar tal acontecimento, um de nós havia de estar louco.

-Poderia ser um pouco mais clara? – Já aceitava a hipótese de ser uma alucinação.


-Há alguns meses fiz um curso de bruxaria, aprendi a mudar minha forma. Prático, não?

-Mas por quê?

-Bolas! Sou uma mulher casada, poderia ter problemas se fosse vista falando ou saindo com você. Aliás, foi muito bom, deu para conhecer você melhor. Agora sei o quanto se deixa seduzir facilmente.


-Eu?!?! De modo algum! Apenas pensei que a Michele pudesse estar precisando de um ombro amigo, alguém para conversar um pouco.

Fomos caminhando enquanto discutíamos, eu tentando explicar o que não tem explicação, ela de cara amarrada molhando os pés nas ondas do mar. Resolvi deixar de me explicar, estava errado mesmo, e o principal, depois de tanto tempo longe, não havia espaço para brigas. Então comecei a chutar forte a água do mar, indo toda sobre seu corpo, a deixando completamente molhada. Enfurecida, Sônia tentou conter meus ataques também chutando água contra mim, mas como chutava muito mais forte, se molhava muito mais e isso a deixava ainda mais nervosa.

Corri em direção dela e segurei firme em seus braços, joguei meu peso contra seu corpo, derrubando-a com facilidade na água. Acabei caindo junto, propositalmente, e começamos a rolar pela água. Sônia tentou lutar um pouco, mais se rendeu ao encanto e nos beijamos como se fosse a primeira vez – aliás, era a primeira vez. Levantamos e saímos fora do alcance da maré.

Sônia flertava coisas em meus ouvidos, aos poucos já não podia ouvir, tudo foi ficando distante. Meus olhos se abriram e logo vi surgir a imagem do meu padrinho, perguntando se desejava acompanhá-lo em uma viagem. Levantei bastante desanimado. Por alguns instantes odiei a quem me batizou, e então ficou a dúvida: “Como terminaria este sonho maravilhoso?” Que pena que o “pra sempre” um dia, sempre acaba.

Como disse, aconteceu e realmente é verdade, só que nas profundezas da mente, também conhecido como sonho...

6 Coveiros:

Rafa Flori disse...

DEUS

Lee disse...

Cara, detesto ter sonho interrompido.=/
=*

J.F. Marques disse...

Parabéns cara, você escreve muito bem, tem o dom. Nunca pare com isso, continue sempre escrevendo, seus leitores agradecem. Ótimo texto. Parabéns mais uma vez.

mateusbonez disse...

UAU, adorei.

http://tiomah.blogspot.com/

Tiago Cervo disse...

Muito legal cara... vc escreveu muito bem... Gostei mesmo

Grande abraço

Lara Veiga disse...

O vocabulário não é rico como em outros textos, mas a estória decorre maravilhosamente, do modo que só vc sabe fazer...

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